Em reunião da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia de Minas Gerais (ALMG), realizada na última semana, os participantes criticaram o projeto estadual de concessão do Parque Fernão Dias, localizado entre Betim e Contagem. Apenas o Instituto Estadual de Florestas (IEF) se posicionou favoravelmente à mudança da gestão da área de proteção ambiental.
Atualmente, a gestão do parque é compartilhada entre a Prefeitura de Contagem e o Governo do Estado, por meio do IEF. Mas, na última semana, o governo divulgou proposta de concessão dos serviços de lazer e entretenimento da unidade de conservação, prevendo um investimento de R$ 13 milhões, em um contrato de 30 anos, por parte do ganhador da concorrência.
Na Câmara de Contagem, o assunto foi destaque em algumas plenárias, com a grande maioria dos vereadores protestando contra o projeto do Governo do Estado. Alguns dos parlamentares, inclusive, têm participado ativamente das articulações para que o Parque continue sob gestão da Prefeitura de Contagem, que fez grande investimento em reformas e revitalizações da área. E o Legislativo de Contagem também teve representante na reunião da ALMG.
A deputada Bella Gonçalves (Psol), que solicitou a reunião, assim como integrantes de entidades ambientais e sociais de Contagem, manifestou-se a favor do atual sistema de gestão do parque. Eles fizeram questionamentos à coordenadora do Núcleo de Projetos Especiais do IEF, Cecília Vilhena, a qual defendeu o modelo de concessão à iniciativa privada.
O subsecretário de Controle Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente de Contagem, Geraldo Abreu, destacou que a APA Fernão Dias tem 98 hectares e foi criada em 2016 por lei estadual, oriunda de projeto da então deputada Marília Campos. Lembrou que, quando a Prefeitura assumiu o parque, a unidade estava em condições precárias. “Fizemos investimentos expressivos, revitalizamos equipamentos para que pudessem ser utilizados pela população; hoje, temos visitas até de outros estados e países”, destacou. Segundo ele, em junho deste ano, a prefeita enviou ofício à Secretaria de Estado de Meio Ambiente, manifestando interesse em municipalizar o parque, e aguarda retorno.
Entidades apontam anos de abandono
Wesley Duarte, do Movimento Todos por Contagem, registrou que o parque ficou fechado por mais de dez anos, “devido ao total abandono pelos municípios envolvidos e pelo Estado”. Só em 2021 foi firmado acordo de gestão pelo Estado e pela Prefeitura de Contagem, a qual investiu R$ 2,6 milhões no local, elevando expressivamente o número de visitantes no local. Ele acredita que nada justifica a concessão, ainda mais por 30 anos, renováveis por outros 30.
Vanderleia Reis, da Frente Popular de Contagem, manifestou preocupação com a ausência de representantes da Prefeitura de Betim. Também questionou a forma como a consulta pública está sendo realizada. Segundo ela, a consulta deveria acontecer no próprio parque, e não em espaços privilegiados de poder, como universidades, sobretudo durante o dia, quando os trabalhadores não podem participar.
Cristina de Oliveira, ativista do Movimento SOS Vargem das Flores, avaliou que a consulta é “para inglês ver” já que em outras iniciativas de concessão, o Governo de Minas teria agido da mesma forma, como no caso do Rodoanel e de audiências sobre a mineração. Na opinião dela, a “privatização do parque vai inibir o acesso dos mais pobres ao local, escancarando a desigualdade social”.
Severino Iabá, do Boi Rosado Ambiental e Movimento Lambuzadas, lembrou que, em audiência sobre a concessão realizada na PUC de Contagem, ficou clara a rejeição da população ao projeto de concessão. Ele se mostrou decepcionado por avaliar que a consulta não deve respeitar a vontade popular.
A vereadora de Contagem Moara Saboia ressaltou que a Prefeitura gasta R$ 800 mil por ano com a manutenção da unidade, já com um modelo de gestão, que inclui parcerias público-privadas para realização de obras, em recursos de emendas parlamentares. Segundo ela, a enquete feita pela Frente Popular de Contagem mostrou que mais de 90% dos entrevistados são contra a concessão.
Estado defende concessões
A coordenadora do Núcleo de Projetos Especiais do IEF, Cecília Vilhena, julgou que seria importante a participação na audiência de representante da Prefeitura de Betim, que conta com 90% da área do Parque Fernão Dias. Sobre a consulta pública, divulgou que o prazo foi adiado até 19 de agosto.
Ela lembrou que a proposta para a unidade está inserida no Programa de Concessão de Parques Estaduais, lançado em 2019, por meio do qual já foram realizadas cinco concessões. Enfatizou a diferença entre privatização e concessão, afirmando que, na primeira, acontece a venda do ativo. Já na concessão, uma empresa assume alguns serviços por tempo determinado, respeitando normas e contratos, e, ao fim do período, tudo é revertido para o Estado.
Segundo ela, o programa tem como premissa a conservação ambiental. “Avaliamos quais áreas seriam passíveis de investimentos privados, mas o Estado mantém sua atribuição de garantir preservação, combatendo incêndios, promovendo a educação ambiental, atendendo à pesquisa científica, entre outras funções”, ressaltou. Por outro lado, a prestação de serviços a usuários, como de alimentação, comércio, vai para um parceiro privado.
O parceiro assumiria o compromisso de realizar investimentos a curto, médio e longo prazos e de fazer manutenções durante toda a vigência do contrato, compartilhando com o órgão concedente parte das receitas obtidas. No caso presente, a partir do segundo ano da concessão, 3% da receita bruta auferidos pela empresa retornam para o Estado, na forma de benefícios sociais e ambientais.
A gestora lembrou que o Parque Fernão Dias, apesar de contar com boa visitação, está subutilizado e precisa de melhorias. Ela adiantou que, entre as premissas do contrato, estão a entrada gratuita para todos Ela citou intervenções a serem realizadas nos dois núcleos do parque. Em Contagem, estão previstas: reforma da portaria, do velódromo e da pista de bicicross; criação de Centro de Visitantes, construção de vestiários, entre outras. Já em Betim, prevê-se a construção de pista de skate e de patins e de áreas de estacionamento, entre outras intervenções. Serão gerados, segundo estimativas, mais de 600 empregos diretos e indiretos e uma arrecadação de R$ 3,4 milhões em impostos.
Impacto Ambiental
A deputada Bella Gonçalves questionou porque o projeto de concessão não prevê estudos de impacto ambiental (EIA) e de impactos na vizinhança. Cecília Vilhena respondeu que não há nenhuma área no parque que gere impacto ambiental considerável. “Queremos continuar propiciando sombra, ar puro, bolsões verdes para a população”, declarou ela, complementando que todas as intervenções previstas serão em áreas modificadas pelo ser humano.
Para a parlamentar, no entanto, não há como o governo se esquivar: “o projeto deveria prever o impacto para a população local, que vai passar a pagar por coisas que utilizar no parque”. Sobre o impacto ambiental, lembrou que a Justiça fechou um parque estadual em Caxambu, porque o Estado não realizou o EIA.
Ao final da reunião, Bella Gonçalves anunciou que vai solicitar a retirada do Parque Fernão Dias do programa de concessões e a renovação do termo de cooperação entre a Prefeitura de Contagem e o IEF. Disse ainda que levará as questões trazidas na reunião ao Ministério Público e que, se não houver diálogo entre os envolvidos, uma ação judicial pode cancelar o processo de licitação.